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quinta-feira, setembro 08, 2005

Retrato cruel da paternidade em “Os Pais dos Outros”




Italiana Romana Petri explica o que a levou a escrever sobre pais e filhos

Rui Azeredo

A escritora italiana Romana Petri tem já editadas em Portugal, pela Cavalo de Ferro, três obras, a última das quais, “Os Pais dos Outros”, é uma colectânea de doze contos, cada um dedicado a uma relação entre pai e filho. São doze pais diferentes, a maior parte dos quais protagonistas de histórias de vida pouco felizes, onde as principais vítimas são os filhos, tanto a nível físico como psicológico. No princípio e no final do livro ficam as notas de esperança, de modo a formar assim um círculo positivo.
A escritora teve uma relação excelente com o pai e decidiu partilhá-la com os outros por entender que é um exemplo a ter em conta. “Tive um infância muito boa”, reconhece Romana Petri, “mas, infelizmente, conhecia muitas pessoas com uma infância muito má”. Assim, “Os Filhos dos Outros” é - explica - “uma vingança para quem sofreu demasiado”. O livro, acrescenta, serve “para consolar esses filhos e denunciar uma violência tão terrível”.
O conto “O pai do Nicola”, o último, é a história de um pai mau que se transforma num pai bom, “com maior disponibilidade; autoritário mas disponível”. “Falar é muito melhor que a distância”, conclui, defendendo que “uma pessoa pode sempre mudar”. Por isso, diz, “os pais de hoje são completamente diferentes”.
No entender de Romana Petri, as crianças hoje têm problemas diferentes, relacionados com “a falta de tempo”. “O ‘pai-dono’ acabou, não é tão dominante como antes”, explicou. A modernidade” e a civilização”, nesta matéria, foram duas ajudas preciosas.

Relatos cruéis mas reais


Todas as histórias de “Os Pais dos Outros” são verdadeiras: “Não consegui ficar calada. Há histórias horrorosas, asquerosas, que achava inacreditáveis”. Reconhece que o livro “é muito cruel, muito duro”, mas… “é menos do que a realidade, que é mais violenta que a literatura”.
Mas às críticas de Romana Petri também não escapam as mães, visto que defende “a denúncia do silêncio da mãe”. Ao silêncio perante situações em que o filho é maltratado pela figura paterna atribui o nome de “cumplicidade”. É algo característico “dos tempos antigos”. Lembra que, no passado, quando a mãe “se revoltava, podia ser abandonada”. “Agora as coisas mudaram”, destaca, considerando que “não é possível justificar a silêncio das mães”.
Ao mesmo tempo, diz a autora, este livro é “uma espécie de pequena história da paternidade italiana de 1940 até hoje” e aquando do seu lançamento em Itália, há seis anos, foi bastante discutido e conheceu enorme sucesso entre psicanalistas e psiquiatras.
Também a nível de grande público “Os Pais dos Outros” foi um êxito já que ultrapassou os 250 mil exemplares vendidos.
Romana Petri tem também publicados em Portugal pela Cavalo de Ferro “A Senhora dos Açores” e “Uma guerra na Úmbria – Case Venia”.
Nascida em Roma, onde vive, Romana Petri passa largas temporadas em Portugal, país que fez questão de conhecer depois das palavras elogiosas do escritor Antonio Tabucchi.